Por que é tão importante discutir identidade e diversidade
na infância? Preconceitos, rótulos, discriminação. É inevitável: desde muito
cedo, os pequenos entram em contato com esses discursos negativos. Para que
eles saibam lidar com a diferença com sensibilidade e equilíbrio, é preciso que
tenham familiaridade com a diversidade
A infância, sobretudo a primeira infância (0 a 6 anos) é central
para o desenvolvimento do sujeito. É na primeira infância que a criança
constrói as habilidades básicas do ser humano (andar, falar, simbolizar). É uma
etapa também de construção de vínculos, identidade, auto estima. É nessa fase
que o sujeito vai construir suas bases para a relação consigo mesmo e com o
outro. Por isso, diversidade, representatividade, identidade e cultura são
discussões centrais para a promoção de direitos e para a construção da
subjetividade na Infância. E, nesse sentido, o brinquedo e o brincar
podem apoiar na construção saudável dessas subjetividades e da própria
sociedade. O brincar tem um papel central na estruturação do sujeito criança.
Quando nesse brincar há um brinquedo, e esse brinquedo é uma representação
humana, como as bonecas e bonecos, e eles não se parecem em nada com a criança
que brinca, sua autoestima é afetada de forma negativa.
Além disso, se a criança só tem acesso a brinquedos que reconheçam
e valorizem um padrão único de beleza e de cidadania, vai ser mais difícil essa
criança reconhecer e valorizar a diversidade presente na sociedade. É
importante que todas as crianças convivam com as diferenças, com o outro, desde
a infância.
É papel da Educação Infantil promover essa discussão sobre
identidade e representatividade na infância?
Sem dúvida. É
na Educação Infantil que a gente começa a lidar com regras e limites da
sociedade, a Educação Infantil é a instituição que formaliza os contratos
sociais vigentes, no que tange à criança. Parte do currículo da Educação
Infantil está centrada na formação do sujeito: ‘o sujeito no mundo’, ‘a relação
com o outro’, ‘a valorização de si mesmo’, ‘o respeito ao outro’, ‘no
aprendizado das regras sociais de convívio’. Ou seja, é terreno fértil para
tratar da diversidade.
Parte desses materiais são o acervo dos brinquedos, que também
compõem as brincadeiras, que, por sua vez, compõem a cultura da infância. As
bonecas e outros brinquedos, então, são uma questão curricular. É preciso
garantir a representatividade nesses brinquedos, para valorizar a autoestima e
a construção da identidade. O brincar e o brinquedo, então, crescem em importância,
e automaticamente se pensa: ‘que boneca é essa que eu estou trazendo? Que
brinquedo é esse? Quem são meus alunos? De onde eles vêm? Quais são as
famílias? Em que sociedade elas estão inseridas?’.
Não dá para escapar da necessidade de se ter, em um ambiente educador,
bonecas pretas, indígenas, mais gordas; bonecos sem armas, pais de família;
brinquedos que não sejam apenas carros para os meninos, e bonecas delicadas e
adultizadas para as meninas, com seio, bumbum, cintura fina, de salto alto.
Então, nada mais legítimo que uma professora de Educação Infantil se enfronhe
nessa temática a partir de uma reflexão do currículo.
Fontes: http://www.avante.org.br/a-importancia-de-tratar-a-diversidade-na-educacao-infantil/https://novaescola.org.br/conteudo/125/diversidade-desde-a-educacao-infantil
Livro: Menina bonita do laço
de fita
Ana Maria Machado
Era uma vez uma menina linda,
linda.
Os olhos pareciam duas
azeitonas pretas brilhantes, os cabelos enroladinhos e bem negros.
A pele era escura e lustrosa,
que nem o pelo da pantera negra na chuva.
Ainda por cima, a mãe gostava
de fazer trancinhas no cabelo dela e enfeitar com laços de fita coloridas.
Ela ficava parecendo uma
princesa das terras da África, ou uma fada do Reino do Luar.
E havia um coelho bem
branquinho, com olhos vermelhos e focinho nervoso sempre tremelicando. O coelho
achava a menina a pessoa mais linda que ele tinha visto na vida.
E pensava:
— Ah, quando eu casar quero ter
uma filha pretinha e linda que nem ela…
Por isso, um dia ele foi até a
casa da menina e perguntou:
— Menina bonita do laço de
fita, qual é teu segredo pra ser tão pretinha?
A menina não sabia, mas
inventou:
— Ah deve ser porque eu caí na
tinta preta quando era pequenina…
O coelho saiu dali, procurou
uma lata de tinta preta e tomou banho nela.
Ficou bem negro, todo contente.
Mas aí veio uma chuva e lavou todo aquele pretume, ele ficou branco outra vez.
Então ele voltou lá na casa da
menina e perguntou outra vez:
— Menina bonita do laço de
fita, qual é teu segredo pra ser tão pretinha?
A menina não sabia, mas
inventou:
— Ah, deve ser porque eu tomei
muito café quando era pequenina.
O coelho saiu dali e tomou
tanto café que perdeu o sono e passou a noite toda fazendo xixi.
Mas não ficou nada preto.
— Menina bonita do laço de
fita, qual o teu segredo para ser tão pretinha?
A menina não sabia, mas
inventou:
— Ah, deve ser porque eu comi
muita jabuticaba quando era pequenina.
O coelho saiu dali e se
empanturrou de jabuticaba até ficar pesadão, sem conseguir sair do lugar. O
máximo que conseguiu foi fazer muito cocozinho preto e redondo feito
jabuticaba. Mas não ficou nada preto.
Então ele voltou lá na casa da
menina e perguntou outra vez:
— Menina bonita do laço de
fita, qual é teu segredo pra ser tão pretinha?
A menina não sabia e… Já ia
inventando outra coisa, uma história de feijoada, quando a mãe dela, que era
uma mulata linda e risonha, resolveu se meter e disse:
— Artes de uma avó preta que
ela tinha…
Aí o coelho, que era bobinho,
mas nem tanto, viu que a mãe da menina devia estar mesmo dizendo a verdade,
porque a gente se parece sempre é com os pais, os tios, os avós e até com os
parentes tortos. E se ele queria ter uma filha pretinha e linda que nem a
menina, tinha era que procurar uma coelha preta para casar.
Não precisou procurar muito.
Logo encontrou uma coelhinha escura como a noite, que achava aquele coelho
branco uma graça.
Foram namorando, casando e
tiveram uma ninhada de filhotes, que coelho quando desanda a ter filhote não
para mais! Tinha coelhos de todas as cores: branco, branco malhado de preto,
preto malhado de branco e até uma coelha bem pretinha.
Já se sabe, afilhada da tal
menina bonita que morava na casa ao lado.
E, quando a coelhinha saía de
laço colorido no pescoço, sempre encontrava alguém que perguntava:
— Coelha bonita do laço de
fita, qual é teu segredo pra ser tão pretinha?
E ela respondia:
— Conselhos da mãe da minha
madrinha…
Bonecas Abayomi: símbolo de resistência, tradição
Para acalentar seus filhos durante as terríveis
viagens a bordo dos tumbeiros – navio de pequeno porte que realizava o
transporte de escravos entre África e Brasil – as mães africanas rasgavam
retalhos de suas saias e a partir deles criavam pequenas bonecas, feitas de
tranças ou nós, que serviam como amuleto de proteção. As bonecas, símbolo de
resistência, ficaram conhecidas como Abayomi, termo que significa ‘Encontro
precioso’, em Iorubá, uma das maiores etnias do continente africano cuja
população habita parte da Nigéria, Benin, Togo e Costa do Marfim.
Ela se tornou
comum na arte popular brasileira a partir do movimento de mulheres negras do
Maranhão, tendo sido criada por Waldilena Martins ou Lena Martins que buscava
na arte popular um instrumento de conscientização e socialização. As bonecas
Abayomis são negras feitas de sobras de tecido que são amarrados resgantando a
forma mais singela do fazer artesanal, sem uso de costuras e o mínimo de
ferramentas.
Através das
bonecas Abayomis busca-se o fortalecimento e o reconhecimento da identidade
afro-brasileira, além disto, permite à criança ou adolescente construir o seu
próprio objeto estimulando a fantasia.
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